O Presente de Isabel

Jurema de Avellar
2 min readDec 5, 2020

POR JUREMA DE AVELLAR

Imagem de StarGladeVintage por Pixabay

Acabou-se a escravidão! decretara a princesa,

Santa bela de Altar, branca, como das igrejas.

Que livres todos se tornem, abram seus novos caminhos.

Caminhem para longe levando

Nos ombros seus novos destinos.

Mas novas sementes brotavam

Não tão de repente tiveram, vários caminhos traçados,

Pois misturadas elas foram, todas sem muitos critérios,

Sobreviventes marcharam, para trás deixaram cemitérios.

Os brancos mantiveram os lucros, com braços brancos chegados,

E com eles de novo bebiam o gosto doce da vida,

Matando a fome do lucro, por eles tanto buscado.

Baniram os corpos escuros, sempre tão doloridos,

Não mais ouviriam seus cantos, seus gritos, lamentos.

Não tinham medo da morte, seriam logo esquecidos,

Nas curvas, desertos, ali desapareceriam.

E assim criou-se uma mistura com força,

Fazendo traços incertos, não eram de lá nem de cá,

Rostos muito diversos, sempre e sempre buscando,

O que no palácio dissera a adorável princesa,

Deusa bonita ela era, com ricas vestes coberta,

Mas só encontraram a frente tristeza, muita tristeza.

E quando gritaram — surpresa enfim a dor se acabou,

Sentiram-se todos perdidos, sem nada, sem chão,

Conheceram então a verdade, sem dó, sem amor,

Uma face não querida — a Senhora Solidão!

E nas escolas, cidades, bem recebidos não eram.

Onde estava o tão falado Perdão?

Dentro da casa dos brancos, em troca de pouco feijão,

Sobreviveriam tristonhos, só de vassoura na mão!

Assim se viram de frente a outra realidade,

Encontraram a Solidão, vestida de Exclusão!

Pois sem o pago se viram novamente explorados,

Era uma volta no tempo, aos velhos tempos cinzentos,

De trabalhar sem ganhar e o prato de angu devorar,

De volta a Escravidão.

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Jurema de Avellar

Nasceu no Rio de Janeiro em 1941. Aprendeu a ler antes dos seis anos e escreve desde os sete. Dona de casa, mãe e avó, encontrou na escrita sua expressão.